1 – O dia faz-se anunciar pela claridade que desponta no horizonte. Pouco a pouco a luz permite-nos ver mais além e os contornos dos objetos e das pessoas fazem-nos avançar com mais segurança. À noite todos os gatos são pardos e podem agigantar-se as ameaças e facilmente sermos surpreendidos por aqueles que nos roubam o sonho. A luz permite-nos discernir melhor e caminhar mais confiantes. É de LUZ que nos fala o Advento e é LUZ que o Natal nos trará em abundância. Enquanto celebramos a ESPERA, em expectativa vigilante, já experimentamos a alegria do encontro certo com Jesus. Não é uma espera banal, passageira, indiferente. É uma espera prometida e com sinais concretos que se efetivará. É Deus que promete e não promete menos que Ele mesmo no meio de nós, para nos redimir, para nos elevar. Comunga a nossa vida, para que O comunguemos, partilhando da Sua vida.
Neste segundo domingo do Advento, surge a inevitável figura de João Batista, interpretando e concretizando as palavras de Isaías. João vem antes ANUNCIAR e PREPARAR o caminho para o Messias, o Emanuel, o Deus connosco. Para que Deus não passe despercebido, o ENVIO de João, como Precursor, adocicando o nosso coração para reconhecermos e acolhermos o Filho de Deus. Quando queremos pedir alguma coisa ao Pai, recorremos à Mãe ou a um irmão para que interceda e amacie o coração do Pai, para que nos conceda o que lhe pedimos. João vem abrir, vem rasgar, vem despertar os nossos corações e as nossas vidas, vem inquietar-nos e despertar-nos. São horas de acordar e levantar. Que o DIA não comece a meio ou se inicie sem nós.
2 – A salvação de Deus está próxima. Tão próxima que até lhe podemos tocar. Não vem descarnada, como aragem que passa sem se fazer sentir, ainda que na leve brisa se possa encontrar Deus. A salvação tem um nome e um rosto: Jesus Cristo, o Filho de Deus. É o Rosto da Misericórdia do Pai. É um tempo novo e um REINO novo, de justiça e verdade, de alegria, de festa e de paz, é um reino sem trono nem coroa nem pompa nem armadura. É um reino de amor, feito de perdão e de serviço.
João Batista vai mostrando como esse Reino é diferente: não exige qualificações nem se rege pelas aparências, não necessita de força ou de armas. O que precisa mesmo é de corações convertidos, dispostos a amar, a servir com alegria, corações dóceis para visualizar o Amor de Deus; pessoas que abdiquem da opacidade para transparecerem a graça que vem de Deus.
Há diferentes reinos e cargos revestidos de poder. "No décimo quinto ano do reinado do imperador Tibério, quando Pôncio Pilatos era governador da Judeia, Herodes tetrarca da Galileia, seu irmão Filipe tetrarca da região da Itureia e Traconítide e Lisânias tetrarca de Abilene, no pontificado de Anás e Caifás...".
Deus tem hora marcada connosco. Vem a todas as horas e em todo o tempo. Mas marca encontro connosco. Por isso, em Jesus Cristo, torna-Se pessoa, como nós. Deixa-Se ver. Deixa-Se tocar. Deixa-Se encontrar e até matar. Podemos pegar-lhe ao colo. Ou podemos pregá-lo numa Cruz. O poder de Deus é tanto que Se reduz à nossa dimensão, para não estar acima, ou à distância, ou incólume à nossa condição humana. Precisa de um lugar, uma manjedoura, um estábulo, e sobretudo quer precisar de nós. Mendiga o nosso amor.
A palavra de Deus é dirigida a João, filho de Zacarias e de Isabel. No deserto. Todos os lugares são bons para Deus nos falar, mas por vezes necessitamos do silêncio e que as coisas e as pressas da vida não nos distraiam nem nos deixem confundir outras vozes com a voz de Deus.
3 – Retenhamos os verbos, disponibilizados por Isaías, daquele que anuncia o VERBO de Deus. Clamar... Preparar... Endireitar... Altear... Abater... Endireitar... Aplanar... e VER. Ver a salvação de Deus. É para este VER que a palavra de Deus nos faz ouvintes. É para este VER que João Batista percorre toda a zona do Jordão, pregando um batismo de penitência para a remissão dos pecados.
«Uma voz clama no deserto: ‘Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas. Sejam alteados todos os vales e abatidos os montes e as colinas; endireitem-se os caminhos tortuosos e aplanem-se as veredas escarpadas; e toda a criatura verá a salvação de Deus’».
Não podemos ficar mudos diante das injustiças. É preciso, também hoje, clamar, até que a voz nos doa. Preparemo-nos. Para recebermos bem preparamos o espaço mas sobretudo o coração e a alegria para fazer com que os convidados, aqueles que chegam, se sintam em casa. Endireitar os nossos caminhos e o nosso olhar para reconhecermos nos outros a presença de Cristo e deles cuidarmos como irmãos. Altear a nossa vida quando existem obstáculos que nos impedem de ver os outros, procurando-os e indo ao seu encontro para ajudar. Abater o orgulho, a inveja e os ódios que nos afastam dos outros, ensoberbecendo-nos, isolando-nos, pondo-nos num pedestal que cria distâncias e nos impede de sentir o calor e o odor dos que caminham connosco. Endireitar, aplanar, para que aqueles que querem vir até nós possam alcançar-nos facilmente.
Os verbos põem-nos em movimento. A vinda de João compromete-nos, mobiliza-nos, faz-nos descruzar os braços e destapar o coração, arejar a mente e faz-nos sair do nosso espaço de conforto. O mais importante da vida, ou pelo menos, aquilo a que damos mais valor, é o que nos custa, nos sai do corpo, e nos faz transpirar. É esta a pregação de João: sair, compor o chão, alisar a terra, investir o melhor de nós, para deixarmos passar Aquele que vem de Deus, e arranjar espaço para que a Palavra tenha lugar em nós e encontre a terra trabalhada e assim a semente possa morrer como semente e nascer como planta, para vir a dar fruto em abundância.
4 – A oração de coleta faz sinfonia e sintonia com o desafio do Precursor. "Concedei, Deus omnipotente e misericordioso, que os cuidados deste mundo não sejam obstáculo para caminharmos generosamente ao encontro de Cristo, mas que a sabedoria do alto nos leve a participar no esplendor da sua glória".
A convocação é para enfrentar os obstáculos, as dificuldades, os medos e as hesitações. O tempo que chega é definitivamente tempo de Deus, que nos é dado para nos aproximarmos uns dos outros e em Jesus Cristo edificarmos uma verdadeira fraternidade.
O profeta faz ecoar as promessas do Deus que vem. É já tempo de deixar a veste de luto e de aflição e revestir o manto da justiça. O nome que Deus nos dá para sempre: «Paz da justiça e glória da piedade».
O clamor do Profeta diante da cidade: «Levanta-te, Jerusalém, sobe ao alto e olha para o Oriente: vê os teus filhos reunidos desde o Poente ao Nascente, por ordem do Deus Santo. É Deus que os reconduz a ti, trazidos em triunfo, como filhos de reis. Deus decidiu abater todos os altos montes e as colinas seculares e encher os vales, para se aplanar a terra, a fim de que Israel possa caminhar em segurança… Deus conduzirá Israel na alegria, à luz da sua glória, com a misericórdia e a justiça que d’Ele procedem».
Baruc ajuda-nos a compreender que mais que abatermos os montes e altearmos os vales, é Deus que o fará. Mas conta connosco. O Precursor, João Batista desafia a nossa conversão para reconhecermos e acolhermos o Messias que vai chegar. Preparamo-nos para Ele chegar. Antes, Deus prepara tudo para que nós possamos caminhar em segurança e chegarmos à Sua glória.
5 – O Advento não é um tempo estático, como víamos, é um tempo de ESPERA ativa. O que lá vem, melhor, Quem vem lá, exige que nos preparemos e trabalhemos o mundo em que vivemos. O Apóstolo Paulo faz da sua missiva à comunidade uma oração que interpela.
«Peço sempre com alegria por todos vós, recordando-me da parte que tomastes na causa do Evangelho, desde o primeiro dia até ao presente. Tenho plena confiança de que Aquele que começou em vós tão boa obra há de levá-la a bom termo até ao dia de Cristo Jesus. Por isso Lhe peço que a vossa caridade cresça cada vez mais em ciência e discernimento, para que possais distinguir o que é melhor e vos torneis puros e irrepreensíveis para o dia de Cristo».
Deus dá início à obra da salvação. Connosco. Estamos dispostos a deixarmo-nos conduzir por Ele?
Pe. Manuel Gonçalves
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Textos para a Eucaristia (C): Bar 5, 1-9; Sl 125 (126); Filip 1, 4-6. 8-11; Lc 3, 1-6.