Manuel Martínez-Sellés - e DEUS fez-Se... célula
MANUEL MARTÍNEZ-SELLÉS (2016). E Deus fez-Se... célula. Apelação: Paulus Editora. 112 páginas.
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MANUEL MARTÍNEZ-SELLÉS (2016). E Deus fez-Se... célula. Apelação: Paulus Editora. 112 páginas.
MONICA HESSE (2019). A guerra aqui tão perto. Amadora: Topseller. 320 páginas.
RAUL MINH'ALMA (2020). Foi sem querer que te quis. Lisboa: Manuscrito. 27.ª edição. 312 páginas.
Em tempo de férias ou em outro qualquer tempo, este romance é uma excelente leitura, envolvente, despoletando diversas emoções e sentimentos, alegria e paz, revolta e tristeza, apreensão e ansiedade, num verdadeiro elogio ao amor, à vida, à generosidade, aos gestos de bondade, ao respeito pelos outros, procurando que o passado seja raiz e não prisão, que o presente seja efetivamente presente, pois o que há de vir, pode chegar de rompante ou pode nem sequer chegar para quem espera.
Raul Minh'alma é já um escritor consagrado pelos milhares de livros publicados e tal é o sucesso que cada livro novo que sai é sinónimo de venda garantia. Confesso que resisti a adquirir e a ler um livro que fosse, ainda que achasse os títulos interessantes e as descrições dos romances igualmente desafiadoras. Para um livro ser best-seller tem, pelo menos, dois caminhos: uma boa campanha de marketing ou por contágio de quem lê e recomenda a outros a leitura. Uma equipa que faça uma boa promoção, que coloque o livro em várias montras, bem publicitado, pode levar muitas pessoas a ler. Não menos eficaz, mesmo que leve mais tempo, mas por certo mais duradouro, o "passa-palavra". Por aí, não será apenas um best-seller, mas vários. E, a meu ver, é o que está a acontecer com Raul Minh'alma. Fui surpreendido. Depois de algumas entrevistas, achei por bem ler pelo menos um livro e agora, após a leitura deste, percebo o sucesso e sei que vou ler outros livros do autor, se Deus quiser e as circunstâncias o permitirem.
"Foi sem querer que te quis". Desde logo o título é muito sugestivo. Entra-se na leitura e somos envolvidos pela vida de Leonardo, que a qualquer momento pode morrer, que tem uma história de vida que o faz ser uma pessoa revoltada com a vida, sem indisposto com os outros, respondendo mal e exigindo tudo. Tem tudo, mas falta-lhe a alegria de viver que o leve a amar e a respeitar os outros. O avô é, ainda assim, a sua âncora, que lhe dá bons conselhos, e a quem respeita, ainda que o seu coração esteja demasiado cheio de nada. Beatriz trabalha num lar, como terapeuta ocupacional e faz também alguns domicílios. A vida dela dava um romance. A sua bondade é extrema, dá-se bem com todos, a todos procura tratar com delicadeza. O avô de Leonardo é um dos utentes do lar, com quem passa muito tempo a conversar, aprendendo a vida. Vai-se percebendo que os seus relacionamentos preenchem vazios, buracos, mas não são partilha de amor. Este é verdadeiramente o sentido da vida, cultivar a arte de amar e deixar que o amor transborde. O verdadeiro amor leva à partilha, transbordando. Quando se ama para preencher os próprios vazios, acaba-se por viver ás prestações, sem um rumo decidido, dependente das migalhas que os outros vão largando. A receita para ser feliz no amor, implica amor-próprio, autoconfiança, paz interior. Só se dá o que se tem, o que se cultiva.
Pouco a pouco, Leonardo vai descobrindo que há outro lado que faz sofrer, mas que dá muito mais sentido à vida. A bondade está lá, precisa de vir ao de cima. A sua rispidez é justificada pela certeza que pode morrer a qualquer momento e, por isso, não quer que as pessoas se apeguem a ele. O papel de Beatriz, pedido expresso de Nicolau, avô de Leonardo, é que lhe desperte a bondade e a alegria de viver, o faça sorrir e ver o lado positivo da vida. A tarefa de Beatriz leva-a a descobrir-se a si mesma e a enfrentar medos, vazios, a confiar mais em si, a não aceitar apenas as migalhas dos sentimentos dos outros.
Como referiu numa entrevista, há histórias que criam procuram deixar vários ensinamentos, sendo realistas. Há histórias que acabam bem: e foram felizes para sempre! e há histórias que acarretam a perda, a doença, e um final que não é expectável num romance literário, mas que é possível na vida real.
Aqui fica a sugestão. Para lá da história, a narração é cuidada, agradavelmente bem escrita, escorreita, permitindo que nos vejamos na história, como se estivéssemos a ver um filme e fizemos parte da própria história ou estivéssemos por perto. É daqueles livros que depois de se começar a ler se quer avançar quanto antes para chegar mais à frente, chegar ao final da história.
GONÇALO M. TAVARES (2018). Cinco Meninos, Cinco Ratos. Lisboa: Bertrand Editora. 224 páginas.
Por vezes esquecemo-nos dos nossos autores ou até preferimos a leitura dos estrangeiros. Mas é um erro pensar que os escritores estrangeiros são melhores que os portugueses. Na verdade, como em tudo, a nacionalidade de um escritor é, talvez, o que menos conta na hora de escrever com imaginação e criatividade. Claro que o contexto também ajuda na na forma de escrever e, sobretudo, nas temáticas que são sendo exploradas. Depois há o marketing que é mais ou menos eficiente e aí depende muito do poder económico da editora, do autor e da país (que pode financiar ou promover diretamente os seus autores).
Gonçalo Tavares é um destes exímios escritores portugueses, já amplamente lidos e divulgados, quer internamente que internacionalmente. Já recebeu diversos prémios literários e as suas obras têm dado lugar, em diferentes países, a peças de teatro, pelas radiofónicas, dança, curtas-metragens, objetos de arte plástica, vídeos de arte, ópera, performances, projetos de arquitetura, teses académicas.
Não o conhecíamos, mas o oferta, da parte da família, de um livro pelo meu aniversário natalício, permitiu-me descobrir um autor genial. Cinco Meninos e Cinco Ratos, apresenta uma criatividade, imaginação, um surrealismo surpreendente. Avivaram-me a memória para livros de José Saramago, cuja imaginação se desmultiplica em personagens, acontecimentos, histórias, lendas, numa linguagem ao correr da pena, melhor, como quem fala... ou de Haruki Murakami, que nunca me farto de ler, e cuja arte da escrita é reconhecida, com um talento ímpar para criar personagens num mundo simultaneamente real e fantasmagórico... Assim, cada um no seus registo e com a sua idiossincrasia, Gonçalo Tavares é exímio a criar/inventar personagens, num texto de agradável leitura, e com personagens que despertam a imaginação, o sonho, um mundo de encantar, com os seus dramas, as suas ironias, as suas alegrias e dúvidas. O mundo fantástico, obviamente, tem raízes e "consequências" no mundo real.
Mais uma excelente leitura que recomendamos.
Cardeal LUÍS ANTÓNIO TAGLE (2017). Aprendi com os últimos. A minha vida, as minhas esperanças. Lisboa: Paulus Editoria. 160 páginas.
No último conclave em que foi eleito o atual Papa, Francisco, então Cardeal Jorge Mario Bergoglio, o Cardeal das Filipas, Tagle, era apontando como um dos possíveis à sucessão do papa Bento XVI. Se já era um Cardeal muito conhecido, pela sua juventude e pela presença nos meios de comunicação e por ser também o responsável da Cáritas Internacional, o que lhe permite viajar um pouco por todo o mundo. Abrindo-se a possibilidade de ser Papa,então a procura da sua biografia, da sua história.
Este livro em formato de entrevista, conduzida por Gerolamo Fazzini e Lorenzo Fazzini, procura apresentar-nos este jovem Bispo e um dos mais novos Cardeais da Santa Igreja, passando pelo berço e contexto em que nasceu e crescer, a sua vocação e a vida como seminaristas, os primeiros anos como padre e os estudos superiores nos EUA, a escolha para Bispo e posteriormente a ascensão a Cardeal. Pelo meio, a escolha para integrar a Comissão Teológica Internacional, presidida então pelo Cardeal Joseph Ratzinger. Quando este o apresentou ao Papa João Paulo II, em dois momentos lhe perguntou a idade e se já tinha feito a Primeira Comunhão.
A biografia revela as origens humildes do Cardeal Tagle, da sua ascendência filipina e chinesa, abarcando a cultura das Filipinas, mas a abertura ao mundo chinês e ao mundo ocidental. Os estudos nos EUA deram-lhe outra perspetiva mais universal da cultura, da religião, do cristianismo, mas simultaneamente, como filipino, pode dar um contributo para a vivência cristã, o testemunho de vida num mundo de muitas dificuldades, o diálogo e a combatividade com os as autoridades locais, a teologia da libertação vista a partir das Filipinas, numa libertação sobretudo ideológica. As dificuldades do povo filipino está presente na sua formação, na pastoral de sacerdote e de bispo, alargando-se pelo facto de ter assumido a Presidência da Cáritas Internacional. Está habituado ao contacto com a pobreza e com os pobres, a trabalhar não tanto para eles, mas a trabalhar com eles, já que o próprio partilhou o trabalho para viver com dignidade. Nos EUA teve que ser criativo para conseguir fazer o doutoramento, passando trabalhos a computador, ajudando os párocos, aproveitando as férias não para descansar mas para prover ao necessário para pagar as propinas.
Hoje é uma referência mundial, mas a humildade, o trato fácil, a afabilidade é visível na entrevista e garantida pelos testemunho dos próprios entrevistadores. É também um homem da comunicação, está presente em diversas redes sociais, interagindo com os diocesanos e com pessoas de todo o mundo.
Na despedida "oficial" dos Cardeais ao papa Bento XVI o diálogo entre os dois suscitou o riso, pelo que os outros cardeais quiseram saber que palavras trocaram. Segredo pontíficio! Revelando um grande humor. Foi oicasião para o Cardeal lembrar ao papa Bento XVI que afinal já tinha feito a Primeira Comunhão.
ANDREA MONDA (2012). Bendita Humildade. O estilo simples de Joseph Ratzinger. Prior Velho: Paulinas Editora. 176 páginas.
No dia 10 de novembro (2017), desloquei-me com três amigos sacerdotes, o Giroto, o Diamantino e o Diogo à VIII Jornada de Teologia Prática na Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa, e um dos conferencistas era precisamente o italiano Andrea Monda, testemunhando o anúncio do Evangelho às gerações atuais. O professor Andrea Monda leciona o equivalente a EMRC, tem um programa na TV2000, num formato semelhante a uma aula de 25 minutos, interagindo com a turma.
Bastava o livro ser referido a Bento XVI / Joseph Ratzinger para me despertar o interesse, mas a conferência de Andrea Monda despertou-me mais o interesse. Mas como digo, bastava ser uma obra sobre Joseph Ratzinger, que já o lia e estudava, para uma ou outra disciplina de Teologia, longe do tempo em que viria a ser eleito Papa. O testemunho da D. Fernanda, que dedicou uma parte importante da sua vida ao Seminário de Lamego, aquando uma missão em Roma, era que àquele Cardeal era muito afável, muito simpático e atencioso, muito simples e muito humano. São características que Andrea Monda também descobrir, sem precisar de muito esforço, bastando o encontro com Bento XVI e os milhentos testemunhos dados por quem conviveu ou convive com o agora Papa Emérito.
O autor mostra que este Homem de Deus, simples, afável, de fácil trato, que olha as pessoas olhos nos olhos, com um olhar profundo e interpelante, atento aos interlecutores, não foi uma novida, sempre foi assim, como seminarista, como padre, como Bispo, como professor, como Prefeito da Congregação para a Doutrina na Fé (ex-Santo Ofício). A comunicação social, desde a primeira hora, não lhe concedeu qualquer interregno de simpatia, pois sendo já conhecido, agora era tempo de levantar suspeitas, insinuações, colocando com rótulos, com preconceitos, pelo facto de ser alemão e pelo facto de ter sido durante tantos anos o fiel guardador da fé, da doutrina católica, como se isso fosse um crime.
Segundo o autor, a HUMILDADE é uma palavra que marca a vida de Joseph Ratzinger / Bento XVI, nas diferentes etapas da vida, como sacerdote, como professor, como Bispo, Cardeal e Prefeito da Congregação da Doutrina da Fé, como Papa. Numa biografia do atual Papa Francisco é sublinha a atenção e o cuidado com que o então Cardeal Ratizinger tratava as pessoas que encontrava, com atenção, colocando-se ao mesmo nível da pessoa. Era um dos poucos cardeais, consta, que não tratava o então Cardeal Jorge Mario Bergoglio com sobranceria, como um Cardeal das periferias, como fazia outras eminências, mas de igual para igual, com respeito, deferência, respeito e simpatia.
É uma humildade assente na verdade, sobretudo a Verdade do Evangelho. A fé é antes de mais um encontro com Jesus. Humildade que assenta na transparência, na comunhão com a Igreja, em comunhão com a "maioria" formada pelos santos. Uma humildade caracterizada pela simplicidade. Basta recordar a primeira vez que apareceu na varanda pontifícia como Papa, o simples servidor da vinha do Senhor, com uma camisola preta, normal, debaixo da batina branca. Mais tarde confessará q dificuldade em usar botões de punho.
Como Prefeito era conhecida a rotina que mantinha, manhã cedo e no final do dia, atravessava a praça de São Pedro, com uma boina na cabeça, sempre disponível para quem se aproximava. Por vezes fazia-se acompanhar por gatos. Sempre cordial e simples. Já como professora passava como segundo ou terceiro coadjutor de uma paróquia de cidade, tal a simplicidade com que interagia com os alunos, nesse caso. Permaneceu sempre assim, simples, cordato e acessível, um sacerdote a caminho, que se move em direção aos outros, colocando-se sempre ao nível dos seus interlecutores.
"Se João Paulo II foi definido como «o pároco do mundo», nesta aceção de simplicidade e humildade, pode-se tranquilamente definir Bento XVI como «coadjutor paroquial do mundo»... Em Bona, Ratzinger podia andar a pé, em Munique, como jovem sacerdote, andava de bicicleta de um lado para o outro, em Tubinga, voltou a recorrer às duas rodas".
A sua vida é marcada pela renúncia. O autor apresenta essa característica fundamental antes de se sonhar que o Papa bávaro iria renunciar ao pontificado, assumindo-se como simples Padre Bento (terá sido essa a designação que propôs usar depois da renúncia). Humildade obediente. Outros foram conduzindo o seu percurso. Vai numa direção e de repente alguém o desafia para outra missão, sempre com o sentido de obediência aos seus superiores.
Como teólogo marcante, o próprio confessou que nunca se propôs apresentar/criar uma linha teológica, mas aprofundar a teologia dentro da comunidade, da Igreja, em comunhão com o testemunho dos santos, uma teologia de joelhos.
"A verdadeira grandeza de homem reside na sua humildade". É uma caracterização que lhe assenta bem. Numa das catequeses, ao apresentar a figura do Papa Gregório Magno, quase poderia falar de si mesmo, lembrando como o monge que se tornou Papa "procurou de todos os modos evitar aquela nomeação; mas, no fim, teve de render-se e, tendo deixado pesarosamente o claustro, dedicou-se à comunidade, consciente de cumprir um dever e de ser simples 'servo dos servos de Deus'".
"Todas as pessoas que de algum modo se encontraram com Joseph-Bento, «ao vivo», puderam constatar a doçura deste homem simples e dialogante, sem traços de altivez nem de afetação... ele é o primeiro a movimentar-se e ir ao encontro dos outros, pondo-se ao seu nível, delicadamente".
Um dos aspetos relevantes do autor - tendo em conta os 24 anos de Joseph na Congregação responsável por ajudar o Papa e a Igreja a manter-se fiel a Jesus Cristo e ao Evangelho, ao nível dos princípios e das palavras em cada tempo -, o dogma! O dogma é o que nos liberta e nos ajuda a viver em dinâmica de amor. «Se na Igreja existem os dogmas, é para que ninguém se engane sobre o amor. Eles expõem-se à acusação de ideologia: na realidade, têm por efeito impedir que o amor seja transformado em ideologia».
BENTO XVI: «Deus não nos deixa tatear na escuridão. Mostrou-se como homem. Ele é tão grande que pode permitir-se tornar-se pequeníssimo».
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