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Escolhas & Percursos

...espaço de discussão, de formação, de cultura, de curiosidades, de interacção. Poderemos estar mais próximos. Deus seja a nossa Esperança e a nossa Alegria...

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06.09.24

Tudo o que faz é admirável. Faz que os surdos ouçam...

mpgpadre

       1 – Em tempos conturbados, a voz do profeta soa a esperança.

       Isaías, na primeira leitura, mostra, com palavras de alento, que a promessa de Deus não tarda em cumprir-se.

“Dizei aos corações perturbados: «Tende coragem, não temais. Aí está o vosso Deus; vem para fazer justiça e dar a recompensa; Ele próprio vem salvar-nos». Então se abrirão os olhos dos cegos e se desimpedirão os ouvidos dos surdos”.

       A convicção do profeta há de congregar o povo eleito e motivar os crentes para a fidelidade a Deus e aos Seus mandamentos. É tempo de recuperar a fé e a esperança em Deus.

 

       2 – No evangelho, Jesus é apresentado como o Messias esperado, o Deus que vem salvar-nos. Isaías identifica alguns dos acontecimentos que sucederão com a Sua chegada, como por exemplo os surdos voltarem a ouvir. Atentemos as palavras do Evangelho:

“Trouxeram-Lhe então um surdo que mal podia falar… Jesus, erguendo os olhos ao Céu, suspirou e disse-lhe: «Efatá», que quer dizer «Abre-te». Imediatamente se abriram os ouvidos do homem, soltou-se-lhe a prisão da língua e começou a falar corretamente…”

       “Ao fazer com que os surdos ouçam”, Jesus confirma que é o Messias que estava para vir. As palavras adquirem vida concreta nesta cura. Com Ele, solta-se a língua, abrem-se os ouvidos, ressoa a palavra de Deus, circula vida nova.

       “Effatá” é também um dos ritos do Batismo, lembrando que a graça recebida nos há de permitir escutar a Palavra de Deus e professar a fé. O que ouvimos e o que dizemos, como seguidores de Jesus, deve ser para louvor e glória de Deus. Se assim for, purificaremos o que ouvimos com a misericórdia de Deus, e diremos palavras que dimanem da caridade do Senhor.

 

       3 – O encontro com Jesus Cristo há de transformar-nos, comprometendo-nos. Interiormente. Ele não Se impõe, não chantageia. Convida, desafia, envolve. Obviamente, a resposta que daremos levar-nos-á a alterar hábitos, a postura diante dos outros.

       Não é uma mudança pela rama, como se trocássemos de roupa. Agora vestimos a roupa de cristãos e vamos à Missa, dizemos as nossas orações, e logo depois, se necessário, vestimos outra roupa, que diga mais com a ocasião ou com as pessoas que temos pela frente.

       Pelo batismo, estamos interiormente revestidos de Cristo. Ele habita-nos. Nas palavras de São Paulo, já não somos nós que vivemos, é Cristo que vive em nós. Ou em Santo Agostinho, ao comungarmos somos assimilados ao Seu corpo, somos transformados n’Ele.

 

       4 – O apóstolo São Tiago, na segunda leitura, ilustra como viver ao jeito de Cristo, em situações concretas. No domingo anterior exemplificava com o serviço aos órfãos e às viúvas, as pessoas mais fragilizadas do seu tempo. Hoje traduz a vivência em Cristo com o amor e respeito igual a todos os que nos aparecem pela frente.

“A fé em Nosso Senhor Jesus Cristo não deve admitir acepção de pessoas. Pode acontecer que na vossa assembleia entre um homem bem vestido e com anéis de ouro e entre também um pobre e mal vestido; talvez olheis para o homem bem vestido e lhe digais: «Tu, senta-te aqui em bom lugar», e ao pobre: «Tu, fica aí de pé», ou então: «Senta-te aí, abaixo do estrado dos meus pés». Não estareis a estabelecer distinções entre vós e a tornar-vos juízes com maus critérios? Escutai, meus caríssimos irmãos: Não escolheu Deus os pobres deste mundo para serem ricos na fé e herdeiros do reino que Ele prometeu àqueles que O amam?”

       Sublinha-se uma vez mais como o serviço e a atenção aos mais pobres é a opção de Jesus Cristo, não para excluir, mas para promover e incluir os que não se sentem ou não são tratados como filhos.


Textos para a Eucaristia (ano B): Is 35, 4-7a; Tg 2, 1-5; Mc 7, 31-37.

06.04.24

Cristo Jesus não Se valeu da sua igualdade com Deus

mpgpadre

       1 – "Cristo Jesus, que era de condição divina, não Se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio. Assumindo a condição de servo, tornou-Se semelhante aos homens. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte e morte de cruz" (2.ª leitura).

       Este belíssimo hino, recolhido por São Paulo na sua missiva aos Filipenses, faz uma apresentação detalhada, sintética, clarividente, expressiva, da vida e missão de Jesus. A Sua condição inicial, que dá origem e alimenta o hoje do Seu compromisso, o trajeto de oblação, de entrega, de kénose (abaixamento), de amor pela humanidade. O amor por nós leva-O a assumir a nossa identidade e a nossa finitude.

       O mistério da Sua paixão, da Sua morte como oferenda, pleniza o Seu projeto de caridade a favor de todo o povo. Não apenas a favor dos amigos, ou dos bons, mas em benefício de todos, bons e maus, amigos e estranhos, judeus, gregos ou troianos.

       Vem de Deus, para habitar connosco, na história e no tempo. A divindade humaniza-se, o Universal particulariza-se num determinado período da história e num espaço civilizacional concreto. Faz-Se homem, para que descubramos por Ele e com Ele o caminho de regresso a Deus Pai, descobrindo a nossa origem, o nosso alimento e o nosso fim: Deus.

       Toda a Sua vida é serviço e doação. Assume-nos por inteiro. Identifica-Se homem. Em tudo igual a nós, exceto no pecado. Não Se alheia da obra criada por Seu amor. Por amor vem. Por amor permanece. Por amor dá a Sua vida. Por amor elevar-nos-á às alturas da glória, até Deus, Seu e nosso Pai.

 

       2 – Nas concepções tradicionais da religião, Deus mantém-se distante, alheado como Juiz impenetrável, impassível, pronto a irritar-se e a castigar, à espera das oferendas, sacrifícios e súplicas da humanidade, vergada à Sua omnipotência.

       Com Cristo Jesus, é Deus Quem procura a humanidade, imiscuindo-Se na nossa história. Deus está onde está a humanidade. As alegrias e as tristezas, as lutas e as esperanças, o sofrimento e a festa, a morte e a vida, que nos envolvem na nossa existência terrena e mortal, integram a história de Jesus, em todo o seu esplendor.

       A liturgia deste domingo é particularmente feliz. A SEMANA SANTA conduz-nos do sucesso e da fama à morte infame, numa cruz, para logo nos encher com a LUZ da Páscoa, em que nada ficará igual, e até o túmulo se encherá de luz e de vida nova.

       Visualizamos a entrada triunfal de Jesus na cidade santa de Jerusalém. É acompanhado por uma multidão imensa, que O aclama como Rei, filho de David, deixando entrever o reconhecimento do Messias prometido e esperado. É sol de pouca dura.

       Ainda ressoam os cânticos, os clamores, e já Jesus Se senta à volta da mesa, mais discretamente, quase silenciosamente. Estão lá apenas os mais íntimos. Como não nos revermos também nesta passagem. Quando as coisas correm bem, todos nos rodeiam e aplaudem, mas quando é necessário trabalhar, esforço e dedicação, com quantos dos nossos amigos poderemos contar?!

       A Ceia pascal é um interregno. Uma pausa para o café. Para descansar. Para ganhar coragem. Para sentir mais próxima a presença dos amigos e sentir o conforto dos mais chegados, preparando-os para a despedida, deixando-lhes as recomendações finais, como um testamento, um compromisso para a vida. Vou partir, mas a minha presença será ainda mais íntima, mais profunda, mais firme. Ainda a Ceia não terminou e já cheira a morte, a traição. O medo e a ansiedade começam a tomar conta dos discípulos. Sente-se aquele tremor no estômago e as pernas não querem obedecer. O vinho parece ter produzido efeito. Nem todos ficam para enfrentar as dificuldades maiores.

 

       3 – Em poucas horas, Jesus experimenta a euforia de uma multidão em festa e de uma multidão furiosa pedindo a Sua cabeça. No triunfo está lá toda a gente. Olhamos para o lado e vemos que não falta ninguém. Também lá nos queremos. Sentimo-nos confortáveis, pertencemos ali, aquele é o nosso povo, a nossa gente, e apesar dos encontrões, não desarmamos, deixamo-nos levar pelo entusiasmo.

       A vida tem altos e baixos e nos momentos do sofrimento, do suor e das lágrimas, nem todos estamos disponíveis. A casa é um espaço mais pequeno. Onde pulsa a vida, o espaço é mais íntimo, facilita o encontro, coração a coração, é mais afetivo, permite o abraço, o choro e o riso desbragado, a casa é o outro em quem coloco a minha vida, é o outro que me acolhe como irmão. Se pudéssemos ficaríamos em casa para sempre. Esta começa a desfazer-se quando alguém abandona o círculo familiar. Judas é o primeiro a sair. Saem os outros, para o Jardim das Oliveiras. A casa não pode ser profanada, há de ser o lugar do reencontro, da vida nova, da vida ressuscitada, quando de novo todos se reconhecerem como irmãos.

       Aqueles que contam acompanham Jesus. Mas ainda não estão amadurecidos o suficiente na sua fé. Maior é o medo. Quando nos sentimos ameaçados na nossa vida biológica, as reações passam pela paralisia, como em sonhos, não conseguimos mexer-nos, ou fugimos rapidamente para nos libertarmos do perigo iminente. Assim acontece com os discípulos. Adormecem, tal é a ansiedade, enquanto o seu Mestre reza, roga a Deus, transpira gotas de sangue, é a Sua hora. Levar o amor até ao fim, mesmo que isso custe a própria vida (biológica), é o alimento, a vontade de Jesus. Numa hora desta, só Deus Lhe pode valer, só Deus Lhe pode dar ânimo (alma) para prosseguir.

       É a vida. Agora que era tão útil a presença dos seus amigos mais íntimos, todos correm rapidamente para não serem "agarrados" por aquela onda de ódio e violência. Mantêm-se à distância. Com medo, com "pena" do Mestre, mas afastados o suficiente para preservarem as suas vidas.

 

       4 – Como não nos revermos nesta SEMANA SANTA de Jesus?! Transpira suor, sangue e lágrimas. Prossegue no limite do desfalecimento. Clama em altos brados. Leva as forças ao limite, por amor. É paixão. Redentora. Homem e Deus envolvidos na mesma história.

       Quantos pais não "morrem" todos os dias pelos filhos? E por causa deles. Canseiras, preocupações, trabalho, lágrimas. A vida até ao esgotamento! Onde parece que não há mais ânimo, lá se encontram argumentos para prosseguir. O amor supera as limitações físicas. Quantos não são testados, todos os dias, até ao limite da sua coragem – uma doença repentina, a falta de trabalho e de pão para a mesa, o sofrimento e a doença crónica de um familiar, o conflito que se agudiza dentro de portas, ou o ambiente desastroso com os colegas de trabalho –, uma via crucis sem solução à vista, um calvário que perdura no tempo, sem sinais esperançosos, sem abertura no céu enublado de lágrimas, de cansaço, de derrota.

       Jesus não passa ao largo das nossas lutas. Não desvia o olhar. Enfrenta connosco as angústias da sobrevivência. "O Senhor Deus abriu-me os ouvidos e eu não resisti nem recuei um passo. Apresentei as costas àqueles que me batiam e a face aos que me arrancavam a barba; não desviei o meu rosto dos que me insultavam e cuspiam. Mas o Senhor Deus veio em meu auxílio, e, por isso, não fiquei envergonhado; tornei o meu rosto duro como pedra, e sei que não ficarei desiludido" (1.ª Leitura).

       Está (quase) sozinho. Os apóstolos tornaram-se apóstatas. À distância. Sua Mãe e algumas mulheres, que sabem o que é sofrer, o que é sofrer por amor, o que é dar a vida pelos filhos e verem os filhos morrer (repentinamente ou aos poucos), elas não desviam o olhar. É doloroso. É a vida. Faz parte da vida. Dali ninguém as tira. Nem a força bruta dos soldados em fúria, nem a multidão cega pela gritaria. Elas que estavam na primeira hora permanecerão até à última hora, até ao suspiro final. 

       "O véu do templo rasgou-se em duas partes de alto a baixo. O centurião que estava em frente de Jesus, ao vê-l’O expirar daquela maneira, exclamou: «Na verdade, este homem era Filho de Deus». Estavam também ali umas mulheres a observar de longe, entre elas Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago e de José, e Salomé, que acompanhavam e serviam Jesus, quando estava na Galileia, e muitas outras que tinham subido com ele a Jerusalém" (Evangelho).

 

       5 – Regressemos a nossas casas. O espetáculo terminou. Jesus morreu. Morreu por amor. Morreu por nós. Morreu para nos salvar. Morreu para nos mostrar que o amor há de ser mais forte, mais firme, mais "violento" e revolucionário que todas as forças do mal e da morte.

       Aguardemos. Com Maria, a Quem Ele nos confia, e com as outras mulheres, voltemos ao lugar onde pulsa a vida, nas suas lutas e nas suas festas, a casa, a nossas casas. Façamos luto. Não deixemos, porém, que o medo e a angústia tomem conta da nossa alma (do nosso ânimo), rezemos com Ela, vigilantes, firmes na esperança, confiantes na promessa de Deus. Não temamos a noite. O SOL esconde-se por entre as lágrimas, os nossos olhos ficam nublosos, mas a LUZ há de ser tão intensa que prevalecerá para além das nossas dores e da nossa treva. A caminho da Páscoa!


Textos para a Eucaristia (ano B): Is 50,4-7; Salmo 21 (22); Filip 2,6-11; Mc 14,1 - 15,47.

09.12.17

Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas

mpgpadre

1 – Vigiai. Era a palavra-chave que escutámos há oito dias. Hoje a palavra-chave é PREPARAI, preparai o caminho do Senhor. É-nos servido o início do Evangelho de São Marcos que nos remete para Isaías, trazendo a promessa de Deus ao Seu povo. Ele enviará um mensageiro na frente para preparar o caminho d'Aquele que há ser enviado para nos trazer a salvação.

João Batista é a voz que no deserto proclama um batismo de penitência para a remissão dos pecados. Ele é voz da Palavra que está a chegar. Para que a Palavra Se seja percetível é urgente que a voz provoque os ouvidos e sobretudo os corações. Demasiada cera pode ser impeditivo de uma boa audição, um coração empedrado terá dificuldade em acolher e em amar Aquele que vem.

É tempo de preparar o caminho, o coração, a vida.

Um caminho que não é utilizado nem é limpo acabará por ficar intransitável. Se é um caminho muito usado, as pegadas e os rodados pisam as ervas que ameaçam nascer e crescer. Pedras que caiam ou silvas que despontam sempre se vão tirando. Mas de vez enquanto é necessário fazer uma limpeza mais a fundo, para que o caminho volte a ser caminho. E se por ele tiver que passar alguém especial então o cuidado será maior.

Está a chegar Jesus, Alguém que nos é muito caro, muito especial, então há que preparar bem o caminho da nossa vida para Ele passar e permanecer em nós. As famílias estavam habituadas no Natal e sobretudo na Páscoa a fazer uma limpeza a fundo nas casas – as barrelas – e nas ruas. É esta a preparação a que São João nos desafia.

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2 – Na 1.ª Leitura, Isaías, uma das figuras do Advento, anuncia a chegada do Emanuel, «O Senhor Deus vem com poder, o seu braço dominará. Como um pastor apascentará o seu rebanho e reunirá os animais dispersos; tomará os cordeiros em seus braços, conduzirá as ovelhas ao seu descanso». O poder de Deus far-se-á serviço, pois não vem para impor e dominar, mas como Pastor para congregar.

Os tempos de treva e dispersão não durarão para sempre. Já se vislumbra no horizonte uma luz a despontar como aurora, uma voz que clama tão forte que não podemos não escutar: «Preparai no deserto o caminho do Senhor, abri na estepe uma estrada para o nosso Deus. Sejam alteados todos os vales e abatidos os montes e as colinas; endireitem-se os caminhos tortuosos e aplanem-se as veredas escarpadas. Então se manifestará a glória do Senhor».

Se Ele vem, se está próxima a Sua chegada, como é que vamos recebê-l’O? Como é que nos vamos preparar? Como é que traduzimos o convite da palavra de Deus?

 

3 – A nossa grandeza há de ser o reflexo da grandeza de Deus, pelo que é na pequenez, na humildade e no abaixamento que deixamos que Deus seja visto em nós como num espelho. "A minha alma engrandece o Senhor". Palavras de Maria que sublinham como a grandeza de Deus Se revela através da humilde serva do Senhor. Isso mesmo foi colocado em evidência por Joseph Ratzinger, futuro Bento XVI, não é Maria que torna Deus maior, mas Ela deixa que Deus Se mostre. Isso mesmo nos é pedido. Parafraseando Santo Agostinho, o nosso egoísmo faz-nos crescer ao ponto de nos entrepormos entre Deus e os outros. A nossa opacidade não permite que os outros vejam em nós ou através de nós. A humildade torna-nos transparentes e, por conseguinte, Deus será visível em nós e para os outros.

Vejamos como São João Batista aponta para Aquele que há de vir em glória e poder. «Vai chegar depois de mim quem é mais forte do que eu, diante do qual eu não sou digno de me inclinar para desatar as correias das suas sandálias. Eu batizo-vos na água, mas Ele batizar-vos-á no Espírito Santo»

Preparar o caminho do Senhor também é isto: treinar a humildade, a capacidade para transparecer Jesus, testemunhar Jesus, deixar que Jesus fale em nós e através de nós. O nosso centro é Jesus e o Seu Evangelho de amor, de perdão e de serviço.


Textos para a Eucaristia (ano B): Is 40, 1-5. 9-11; Sl 84 (85); 2 Pedro 3, 8-14; Mc 1, 1-8.

18.12.16

A virgem dará à luz um filho e o seu nome será Emanuel

mpgpadre

1 – O sonho comanda a vida. O Sonho é uma constante da vida. Sempre que o homem sonha, o mundo pula e avança (António Gedeão). Deus quer, o homem sonha e a obra nasce (Fernando Pessoa). A vida acaba quando o sonho acaba, quando já não há esperança, nem aquém nem além. Sonhos e projetos, confiança no futuro, promessa de eternidade a iniciar-se na história. A esperança é a última a morrer, faz-nos passar ao outro mar.

       Há pessoas que já há muito deixaram de sonhar. Dizem elas, como desabafo, como desilusão, mas com a réstia de esperança que o que desdizem afinal não se confirme. Para os adeptos de futebol, quando a equipa está a perder, até ao último minuto vivem num misto de realidade e esperança... ainda falta um minuto, alguém vai marcar! A vida é mesmo assim. É claro que muitas pessoas vivem voltadas para o passado e esquecem-se de viver o presente e projetar o futuro. Mas mesmo em situações mais extremas, a saudade do passado é a forma de se manterem vivas, sonhando/esperando que voltem esses tempos. Seria ótimo que a presença do passado as levasse a procurar apreciar e viver novas situações.

       Outros há, que sonham o tempo todo, sempre com ganas de viver, de sugerir, de projetar. Por vezes, colam-se apenas aos sonhos e esquecem-se que os sonhos precisam de ser concretizados no tempo e na história e não apenas projetados na mente. Há sonhos que nunca realizaremos mas que, ainda assim, nos puxam para a frente, para o futuro. Há o sonho de deixar marcas positivas no mundo. Mesmo aqueles que deixam marcas negativas é com o sonho de não serem esquecidos. Sonhamos a dormir e sonhamos acordados. Quando jovens sonhamos mudar o mundo. Quando entrados na idade, sonhamos que outros sonhem em mudar o mundo.

       José teve um sonho. Não foi um sonho qualquer. Foi um sonho para mudar o mundo, a história, a sua e a nossa, a história da humanidade. O sonho de José faz dele uma personagem importante para a história da salvação, Deus entre nós, Deus connosco. Não há que ter medo de sonhar. Os sonhos equilibram a mente, por um lado, e, por outro, ajudam-nos a levantar-nos cada dia com um sorriso.

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       2 – José teve um sonho. Outro José, noutro contexto, conhecido como José do Egipto, e antepassado de São José, tornou-se importante à custa dos sonhos que interpretou para o Faraó, ganhando relevância, o que lhe permitiu salvar a sua família e o seu povo da miséria. São José tem um sonho que, do mesmo modo, faz com que se assuma guardião da Família sagrada.

       São Mateus apresenta-nos o nascimento de Jesus, sublinhando o mistério de Deus que age em nós e através de nós. A Virgem Imaculada concebeu por virtude do Espírito Santo. José, tomando consciência da gravidez de Maria, sem que tivesse convivido com Ela, decide repudiá-la em segredo, evitando difamá-la e açambarcando com a responsabilidade. Ao fugir assumia-se por culpado de "desonrar" Maria e impedia que Ela fosse condenada e quem sabe apedrejada.

       Mas os nossos pensamentos nem sempre são os de Deus e as nossas decisões nem sempre são as mais justas, ainda que assim o julguemos. Deus, também aqui, impele a escrever a história de uma maneira nova. Em sonho, Deus envia o Seu Anjo que revela a missão que José há de assumir: «José, filho de David, não temas receber Maria, tua esposa, pois o que nela se gerou é fruto do Espírito Santo. Ela dará à luz um Filho e tu pôr-Lhe-ás o nome de Jesus, porque Ele salvará o povo dos seus pecados».

       O sonho altera a decisão de José, que recebe Maria por esposa, tornando-se o protetor da Sagrada Família, dando o nome a Jesus, assegurando que Maria e José terão um lar seguro e confortável para viver.

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       3 – O sonho vem de longe e a promessa também. A primeira leitura recorda-nos essa promessa feita ao povo eleito, através do rei Acaz, a quem Isaías desafia a pedir um sinal. Acaz não se sente confortável o suficiente para pedir um sinal ao Senhor, considerando uma tentação ou mesmo uma blasfémia. Quando pedem um sinal a Jesus, Este repreende-os por testarem a Deus, dizendo que é uma geração perversa, que não está atenta aos verdadeiros sinais nem ao tempo novo que está a emergir com a Sua vida.

       Agora, contudo, é o próprio Deus que sanciona o sinal. Isaías, em nome de Deus, diz a Acaz: «Escutai, casa de David: Não vos basta que andeis a molestar os homens para quererdes também molestar o meu Deus? Por isso, o próprio Senhor vos dará um sinal: a virgem conceberá e dará à luz um filho e o seu nome será Emanuel».

       São Mateus, ao concluir o relato do sonho de São José, diz claramente que a promessa se cumpre agora. Logo que José desperta do sonho, age em conformidade com as palavras do Anjo do Senhor.

       O sonho é verdadeiramente importante se nos faz acordar e nos leva a agir. Por si mesmo, o sonho é pouco relevante se não tiver consequência, se não conduzir à mudança de vida. Os sonhos, com efeito, não são nem positivos nem negativos, mesmo que pareçam pesadelos. Quando muito fazem sobressair a necessidade da nossa mente ordenar o que pensamos, os conhecimentos que vamos armazenando ao longo da vida, as sensações e emoções que vivemos. Mas, havendo algum sonho a que demos mais importância, que seja para nos ajudar a melhorar a nossa vida e a vida dos irmãos.

       Do mesmo jeito, os sonhos, os projetos, as promessas, sejam um catalisador para nos envolver-nos na transformação positiva do mundo, empenhando-nos em transparecer e testemunhar a misericórdia de Deus, plenizada e encarnada em Jesus Cristo.

 

       4 – O Apóstolo Paulo, tal como São José, também foi surpreendido por Deus. As suas certezas e convicções são postas em causa com o surgimento de Deus na sua vida. A caminho de Damasco, em busca da verdade, Paulo é "apanhado" por Jesus e de perseguidor passa a seguidor.

       Em mais esta belíssima missiva, aos Romanos, o Apóstolo aponta para Jesus, que nasceu, segundo a carne, da descendência de David mas, segundo o Espírito, foi constituído Filho de Deus. A missão do Apóstolo é transparecer, testemunhar, anunciar Jesus Cristo, levá-l'O a todo o mundo, pregando o Evangelho da santidade, o mesmo é dizer, o Evangelho da caridade.

       A referência primeira, para o apóstolo, e para nós também, é a ressurreição de Jesus Cristo. Ele torna-Se para sempre o nosso Salvador. O Filho de Deus nasceu como um de nós, da nossa carne e dos nossos ossos, para nos ressuscitar para Deus, elevando-nos com Ele para a eternidade.

       A oração de coleta resume bem este mistério da nossa fé: "Infundi, Senhor, a vossa graça em nossas almas, para que nós, que pela anunciação do Anjo conhecemos a encarnação de Cristo, vosso Filho, pela sua paixão e morte na cruz alcancemos a glória da ressurreição".

       Pela oração predispomo-nos a acolher o sonho de Deus, o Seu projeto de amor, de vida nova, em que todos nos reconheçamos como irmãos e nos tratemos como tal.


Textos para a Eucaristia (A): Is 7, 10-14; Sl 23 (24); Rom 1, 1-7; Mt 1, 18-24.

11.10.14

Convidai para as bodas todos os que encontrardes

mpgpadre

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1 – Depois de três parábolas sobre a vinha, Jesus compara agora o reino de Deus a um rei que oferece um banquete. Para este banquete, convida os seus amigos. No entanto, um a um vão-se desculpando, apresentando todo o tipo de justificações ou de desculpas. Recusam o convite, e ainda tratam mal os emissários. Então o rei manda os seus exércitos para lhes dar uma lição definitiva, destruindo a cidade.

O rei alarga o convite: «Ide às encruzilhadas dos caminhos e convidai para as bodas todos os que encontrardes». Os servos reuniram todas as pessoas que encontraram pelo caminho, bons e maus.

Quando o rei entrou viu que a sala do banquete estava cheia de (novos) convidados. Reparou, contudo, que havia um homem que não estava com o traje nupcial: «Amigo, como entraste aqui sem o traje nupcial?». Como não obtivesse resposta, o rei mandou os criados que lhe amarrassem as mãos e os pés e o lançassem no exterior.

Jesus conclui o seu relato, dizendo: «Muitos são os chamados, mas poucos os escolhidos».

 

2 – Esquecendo a parte bélica da parábola, o rei é o próprio Deus que convida. Aqueles que se julgam salvos, afinal estão a cavar a própria sepultura.

Jesus, na Sua missão evangelizadora, vem pelos caminhos e encruzilhadas da vida, e chama maus e bons. A salvação é para todos. A condição é deixar o que se está a fazer, a vida anterior, tudo o que nos distancia de Deus e dos outros, para entrar no banquete nupcial, na alegria da salvação, entrar no reino de Amor que Jesus inaugura. Ninguém está a mais. A sala enche-se a partir do momento em que todas as ruelas e vielas ficam vazias, a partir do momento em que as periferias vêm para o centro, vêm para Jesus, ou no momento em que o amor, Jesus, a vida em abundância, chega a todos os recônditos.

Um aviso apenas: quando seguimos Jesus devemos segui-l'O por inteiro. Temos de vestir o traje nupcial, despindo a roupagem anterior e vestindo um traje luminoso, que nos torne transparentes, afáveis, próximos, mais iguais, mais irmãos, dóceis, mais justos, mais amigos, mais família; um traje ágil, leve, atraente, que nos permita acariciar, dar as mãos, beijar, afagar o rosto do outro; trajes que não nos afastem e não nos cataloguem em categorias que nos dividam e nos levem a ter gestos mecânicos com muita etiqueta mas com pouco amor. Precisamos deixar que a nossa vida, atravessada pelo Espírito Santo, se converta e transpareça Jesus Cristo.

 

3 – A linguagem do Evangelho é sugestiva. Quem não se sente bem entre iguais, entre irmãos, num banquete, sem formalismos vazios, mas com a dignidade de se sentir convidado, de se sentir em família, de se sentir como príncipe ou princesa?! Somos mais que isso. Somos filhos. Estamos em casa, descontraídos, felizes.

Vejamos a descrição de Isaías sobre este banquete:

"Sobre este monte, o Senhor do Universo há de preparar para todos os povos um banquete de manjares suculentos, um banquete de vinhos deliciosos: comida de boa gordura, vinhos puríssimos… O Senhor Deus enxugará as lágrimas de todas as faces e fará desaparecer da terra inteira o opróbrio que pesa sobre o seu povo"

É um banquete para todos, com os melhores manjares, à discrição. O melhor que pode haver. É motivo para aclamar: «Eis o nosso Deus, de quem esperávamos a salvação; é o Senhor, em quem pusemos a nossa confiança. Alegremo-nos e rejubilemos, porque nos salvou. A mão do Senhor pousará sobre este monte». «O Senhor é meu pastor: nada me falta. Leva-me a descansar em verdes prados, conduz-me às águas refrescantes e reconforta a minha alma. / Para mim preparais a mesa à vista dos meus adversários; com óleo me perfumais a cabeça e o meu cálice transborda».


Textos para a Eucaristia (ano A): Is 25, 6-10a; Sl 22 (23); Filip 4, 12-14. 19-20; Mt 22, 1-14.

 

08.02.14

Vós sois o sal da terra, a luz do mundo...

mpgpadre

       1 – Disse Jesus aos seus discípulos: «Vós sois o sal da terra. Mas se ele perder a força, com que há de salgar-se? Vós sois a luz do mundo. Não se acende uma lâmpada para a colocar debaixo do alqueire, mas sobre o candelabro, onde brilha para todos os que estão em casa. Assim deve brilhar a vossa luz diante dos homens, para que, vendo as vossas boas obras, glorifiquem o vosso Pai que está nos Céus».

       2 – Vós sois para o mundo o que o sal é na comida: tempero, sabor, sentido. Sois no mundo o que a luz é no meio das trevas: caminho, orientação, transparência.

       Já todos fomos surpreendidos, em alguma ocasião, por uma refeição insossa. Curiosamente, a sabor está nos alimentos, na carne, no peixe, na hortaliça, nas batatas, no arroz, nos ovos. O sal permite-nos apreciar as diferentes dietas alimentares. Se falta sal nada sabe bem.

       Habituados que estamos à eletricidade, quando falha logo ficamos desnorteados e procuramos resolver o problema com uma vela, uma lanterna, com a luz do telemóvel,  com o medo de chocar contra algum objeto. É um transtorno.

       Mas basta um lampejo de claridade e já nos orientamos. E se cada um de nós for essa pequena luz para os outros? E se juntarmos a nossa à luz do vizinho?

        3 – E como ser luz e sal, que dá tempero e ilumina a vida, no nosso dia-a-dia?

       A belíssima página de Isaías mostra-nos o caminho, revelando-nos as palavras de Deus: «Reparte o teu pão com o faminto, dá pousada aos pobres sem abrigo, leva roupa ao que não tem que vestir e não voltes as costas ao teu semelhante. Então a tua luz despontará como a aurora e as tuas feridas não tardarão a sarar... Se tirares do meio de ti a opressão, os gestos de ameaça e as palavras ofensivas, se deres do teu pão ao faminto e matares a fome ao indigente, a tua luz brilhará na escuridão e a tua noite será como o meio-dia».

       Na mesma sequência o salmista nos envolve na resposta à palavra de Deus: «O justo deixará memória eterna. O seu coração é inabalável, nada teme; reparte com largueza pelos pobres, a sua generosidade permanece para sempre e pode levantar a cabeça com altivez».

       Como sublinha Jesus no Evangelho: as vossas/nossas boas obras serão a luz que brilha diante dos homens e iluminam o mundo.

 

       4 – O cristianismo não é um exercício intelectual ou uma abstração. É uma realidade concreta, situada no tempo e no espaço. O ponto de partida e de chegada, o chão que nos ampara, é Deus e o Deus de Jesus Cristo. Deus connosco. Próximo, e que Se faz estrada e vem sujar as mãos na terra, envolvendo-se com a nossa fragilidade e finitude. Procura-nos.

       É isto mesmo que sublinha o apóstolo, que não se anuncia a si mesmo ou alguma doutrina especial, que não tenta iludir com bonitas palavras, mas apresenta Jesus Cristo: “Irmãos, pensei que, entre vós, não devia saber nada senão Jesus Cristo, e Jesus Cristo crucificado”.

       A fé une-nos uns aos outros e compromete-nos com o bem de todos. Não é possível, sob pena de nos tornarmos mentirosos, separar a fé das obras e da vida. A fé faz-nos olhar para Deus com amor. Se olhamos para Deus com Amor, acolhendo-O na nossa vida, não poderemos desprezar a vida dos nossos irmãos, que são ROSTO e PRESENÇA de Deus, aqui e agora (hic et nunc).


Textos para a Eucaristia (ano A): Is 58, 7-10; Sl 111 (112); 1 Cor 2, 1-5; Mt 5, 13-16.

 

25.01.14

Vinde e segui-Me e farei de vós pescadores de homens

mpgpadre

       1 – «Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos Céus». Comum a João e a Jesus, o convite ao arrependimento, aderindo ao bem, à justiça e à verdade. A motivação maior é a proximidade do Reino de Deus. São Mateus mostra-nos esta continuidade entre a voz e a palavra, entre o Precursor e o Messias, entre o Batista e o Cristo, o Filho de Deus, mas também a rutura: Jesus é a Luz para as Nações.

       Mateus mostra-nos outra continuidade, Jesus é o Messias anunciado pelo profeta: “o povo que andava nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam nas sombras da morte uma luz se levantou. Multiplicastes a sua alegria, aumentastes o seu contentamento. Rejubilam na vossa presença, como os que se alegram no tempo da colheita… Vós quebrastes o jugo que pesava sobre o povo, o madeiro que ele tinha sobre os ombros e o bastão do opressor”.

       Jesus, qual servo sofredor, impõe-se pela Palavra, pelo Amor, pela Bondade. Com Ele, a grande LUZ, o Céu desce à terra, Deus faz-Se tão frágil, que Se torna homem, um de nós, um dos nossos.

       2 – Veja-se, antes de mais, a delicadeza de Jesus. Inicia a vida pública, ou pelo menos, torna mais visível e intensa a sua atividade missionária a partir do momento em que João Batista foi preso. Não faz concorrência a João, nem ofusca o seu ministério, ainda que a consciência cada vez mais esclarecida de João apontem para Jesus.

       A continuidade discursiva (e prática) é evidente. A marca dos discípulos de João é a mesma dos de Jesus: conversão, adequação da própria vontade à vontade de Deus. Com Jesus vem a força do Espírito Santo que Ele dará a todo aquele que se predispuser a alargar o próprio coração para acolher Deus e se dar aos irmãos.

       De início Jesus faz-Se acompanhar mais de perto por alguns discípulos. Anuncia-se o Evangelho a pessoas concretas, ao Sr. António, à D. Maria que todos dias vejo à janela, ao Sr. Joaquim que me dá boleia para o trabalho, ao Luís que sempre me fala, ao tio Zé que fica feliz quando me vê e lhe pergunto se a esposa está melhor.

       Jesus cruza-se com pessoas de carne e osso e, sendo verdadeiramente Homem, precisa de outras mãos e de outros corações. Precisa de quem possa continuar o que Ele diz e faz. Chama Pedro, Tiago e João, André e Filipe, Mateus e Judas, Ana e Sofia, Ricardo e Maria, chama cada um de nós. Ouçamos o que diz, vejamos o que faz, para depois sermos nós evangelizadores, refletindo o Deus que nos habita.

       «Vinde e segui-Me e farei de vós pescadores de homens». Eles foram. E nós, aceitamos o repto de Jesus? Pelo caminho, Jesus anuncia o Reino de Deus, cura as pessoas das suas enfermidades. As palavras concretizam-se em gestos concretos.

 

       3 – Para seguir Jesus há certamente muitas condições, o essencial, porém, é deixar-se plasmar e guiar pelo Espírito Santo. Não vamos sozinhos. Deus está connosco, através do Seu Espírito de Amor. Quando as trevas forem mais fortes, rezemos, voltemos a rezar, para que a Sua vontade se realize em nossas vidas.

       “O Senhor é minha luz e salvação: a quem hei de temer? O Senhor é protetor da minha vida: de quem hei de ter medo?”. Se Ele está por nós, quem estará contra nós?


Textos para a Eucaristia (ano A): Is 8, 23b – 9, 3 ; Sl 26 (27); 1 Cor 1, 10-13.17; Mt 4, 12-23.

 

Reflexão Dominical COMPLETA na página da Paróquia de Tabuaço

e no nosso outro blogue CARITAS IN VERITATE.

25.08.13

Esforçai-vos por entrar pela porta estreita

mpgpadre

       1 – Há últimos que serão dos primeiros e primeiros que serão dos últimos.

       Em Jesus, todos somos filhos de Deus e como irmãos devemos cuidar uns dos outros e sobretudo dos mais frágeis. Esta é uma forma privilegiada de encontrar Deus. Além disso, as sociedades tendem a gerar ódios e violências quando há uns que têm tudo e outros que não têm nada. Quem nada tem, nada tem a perder no meio do caos que se possa instalar.

       Os “privilegiados” pelo trabalho, pela herança patrimonial e/ou pela sorte devem sentir-se corresponsáveis, sabendo que há mais alegria em dar do que em receber. E “um obrigado” muitas vezes vale mais do que alguns milhares de euros. Na lógica do evangelho e da vida, o dom só tem sentido se partilhado. O pecado das origens tem muito a ver com isto, como recordava D. António Couto, aos jovens Crismandos, o pecado não está no colher o fruto da árvore, mas no arrebanhar esse fruto sem o partilhar, fechando as mãos. Só eu poderei colher os frutos daquela árvore. Eu. Eva e Adão. Mais ninguém. A árvore é para todos, também para os filhos e para as gerações futuras, e para outros casais. O que recebi não tenho o direito de reter…

       Curiosa aquela passagem da Sagrada Escritura a que se juntam as palavras de Caim: serei guarda do meu irmão? Egoísmo. Se alguém me faz frente ou sombra, excluo ou mato?! A palavra de Deus é clara: sou guarda do meu irmão, sou responsável por ele. Não matarás. Amarás o próximo como a ti mesmo.

       A este propósito, o povo Eleito tinha uma lei que repunha mais igualdade e justiça. A cada 7 anos, a terra, a vinha e olival descansavam e os pobres podiam alimentar-se (Ex 23, 10-11), e os escravos ser libertos (Ex 21, 1-11). Por outro lado, a contagem 7 X 7 anos, 49 anos, findos os quais se realizava o Jubileu, dia do grande Perdão: “Cada um de vós voltará à sua propriedade, e à sua família... Se o teu irmão cair na pobreza e vender uma parte da sua propriedade, a que tem direito de resgate, o seu parente mais próximo deve ir resgatar o que o seu irmão vendeu” (Lv 25, 8-34).

       2 – Há últimos que serão dos primeiros e primeiros que serão dos últimos.

       Reconhecemos os últimos do nosso tempo com demasiada facilidade: pobres, desempregados, deficientes, maltrapilhos, cada vez mais, os sem-abrigo, mulheres maltratadas, crianças sem família, pedintes, famintos, famílias endividadas (algumas por culpa própria, muitas pelo sistema económico-financeiro colapsado), devido a expectativas exacerbadas, ou consequência de falências danosas que geraram milhares de novos desempregados, os emigrantes (uns poucos por vontade própria, muitos porque não terem outro remédio), à procura de novas pátrias, muitos morrendo na travessia, como sublinhou a visita do Papa Francisco a Lampedusa, os idosos, uma franja significativa da sociedade que por vezes é esquecida como o casaco de inverno no bengaleiro durante a maior parte do ano…

       Se a bolsa de valores tiver uma ligeira queda, alerta o Papa, logo se gera um drama. Morrem milhares de pessoas por dia à fome, vítimas de violência doméstica, da droga, de guerras, de milícias populares, de rixas entre bandos… Paciência, é a vida!!!

 

       3 – Há últimos que serão dos primeiros e primeiros que serão dos últimos.

       Alguém se acerca de Jesus e pergunta: «Senhor, são poucos os que se salvam?». Resposta pronta de Jesus «Esforçai-vos por entrar pela porta estreita, porque Eu vos digo que muitos tentarão entrar sem o conseguir». Não vos preocupeis com a quantidade dos que se salvam. É dom de Deus. Preocupais-vos em entrar pela porta estreita.

       Somos responsáveis pelos outros, mas não podemos obrigar os outros a agir desta ou daquela maneira. “Quem Me fez juiz das vossas partilhas?”

       O cuidado dos mais desfavorecidos não é uma opção do discípulo de Jesus, é uma exigência. A fé provoca as obras, exige compromissos concretos com o bem dos outros. O "salve-se quem puder" para os cristãos terá de ser salvação acolhida, vivida e celebrada em comunidade. Não posso obrigar os outros. Devo obrigar-me a mim, como seguidor de Jesus, esforçando-me por entrar pela porta estreita.

       Amar a Deus implica amar aqueles que Deus ama. Não se pode amar o Pai odiando os filhos. Amamos a Deus cuidando dos irmãos. Ou somos mentirosos. A fé sem obras é perfeitamente dispensável, é como árvore sem frutos, diria Bento XVI. As obras testam, explicitam e tornam a fé significativa e relevante.


Textos para a Eucaristia (ano C): Is 66, 18-21; Heb 12, 5-7.11-13; Lc 13, 22-30.

 

24.03.13

Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito

mpgpadre

       1 – Semana Santa, pois SANTO é Aquele vem da parte de Deus e nos dá Deus. Jesus percorre connosco as diversas situações da vida, como facilmente se visualiza nos dois momentos que se entrelaçam: entrada triunfal em Jerusalém, um REI sentado num jumentinho, e processo que condena Jesus, com uma coroa de espinhos e suspenso numa cruz.

       Na epístola de São Paulo aos Filipenses, encontramos um ponto de partida luminoso, uma grande síntese da vida de Jesus:

“Cristo Jesus, que era de condição divina, não Se valeu da sua igualdade com Deus, mas aniquilou-Se a Si próprio. Aparecendo como homem, humilhou-Se ainda mais, obedecendo até à morte e morte de cruz. Por isso Deus O exaltou e Lhe deu um nome que está acima de todos os nomes”.

       A realeza de Jesus é despojada de poder. Não vem numa caravana, protegido por um exército, vem num jumentinho.

       2 – Quando as coisas parecem estar a correr bem, eis que Jesus lhes revela um tempo de grande provação. Fá-lo na intimidade da casa e da refeição, com palavras e gestos já nossos conhecidos: “Tomai e reparti entre vós, pois digo-vos que não tornarei a beber do fruto da videira, até que venha o reino de Deus...”

       A casa começa a desfazer-se. Um deles levanta-se da mesa e sai de casa. Doravante a casa fica vulnerável, exposta.

       O edifício começa a desmoronar-se e o espírito de sobrevivência vem ao de cima: “Levantou-se também entre eles uma questão: qual deles se devia considerar o maior?... O maior entre vós seja como o menor e aquele que manda seja como quem serve. Pois quem é o maior: o que está à mesa ou o que serve? Não é o que está à mesa? Ora Eu estou no meio de vós como aquele que serve...”

       No momento da Ceia, a última ou a primeira, Jesus clarifica de novo a opção pelo serviço: EU estou no meio de vós para servir e dar a vida. A disputa não é pelo poder, mas pelo amor.

       3 – A ceia avança, e as horas aceleram. É tempo de Jesus solidificar a adesão e o seguimento dos seus discípulos.

       Diz Jesus a Pedro: “Eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça. E tu, uma vez convertido, fortalece os teus irmãos». Depois de Jesus ser preso, Pedro não resistirá ao medo e à vergonha: «Esse homem, com certeza, também andava com Jesus, pois até é galileu». Pedro respondeu: «Homem, não sei o que dizes»... Por três vezes Pedro se coloca fora da comunhão com Jesus, contradizendo a predisposição manifestada quando está à mesa com Jesus.

       Aos discípulos ainda lhes falta a maturidade do sofrimento e das contrariedades. Precisam de muita oração e de muita confiança em Deus. “Então saiu e foi, como de costume, para o monte das Oliveiras e os discípulos acompanharam-n’O. Quando chegou ao local, disse-lhes: «Orai, para não entrardes em tentação... Porque estais a dormir? Levantai-vos e orai, para não entrardes em tentação»...

       Das indicações de Jesus, a oração é a primeira.

       4 – Jesus sai do Jardim das Oliveiras e entra triunfalmente em Jerusalém. Agora de novo vai para o Jardim, para rezar, para Se configurar mais à vontade de Deus. Leva os discípulos, para Se sentir apoiado. Mas eles dormem, estão demasiado ansiosos. O Mestre vai morrer. Não querem acreditar. Não pode ser.

“Judas aproximou-se de Jesus, para O beijar. Disse-lhe Jesus: «Judas, é com um beijo que entregas o Filho do homem?».

       Ser traído é sempre mau. Ser traído pelo melhor amigo, o homem de confiança é inacreditável. O cumprimento de Judas a Jesus é o de um amigo próximo e confidente. Perdoa-lhes, Senhor, ele perdeu o juízo, não sabe o que está a fazer…

       Jesus não responde com injúrias ou palavrões: «Tu és então o Filho de Deus?». Jesus respondeu-lhes: «Vós mesmos dizeis que Eu sou». Confirma apenas o que abertamente já tinha dito: EU SOU.

       Subida para o Calvário, com a pesada CRUZ às costas, vergado pelo cansaço, pela desilusão, pelo desamparo dos discípulos, pelas acusações injustas, pelas vergastadas, pelas invetivas da multidão.

       É crucificado, e a postura é a mesma de sempre. De perdão: «Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem». De entrega confiante ao Pai: “E Jesus exclamou com voz forte: «Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito». Dito isto, expirou”.

       Mas a história não acaba aqui. Há de continuar ao terceiro dia…


Textos para a Eucaristia (ano C): Lc 19, 28-40; Is. 50, 4-7; Sl 21 (22); Filip 2, 6-11; Lc 22, 14 – 23, 56

 

10.02.13

Faz-te ao largo e lançai as redes para a pesca

mpgpadre

       1 – O evangelho faz-nos descobrir Jesus como Mestre da Sensibilidade, seguindo a intuição de Augusto Cury. Nos homens mais rudes, Ele garimpa tesouros. Jesus passa de uma à outra margem. Vem para o nosso lado. Sobe ao barco para nos ver a todos. Ensina-nos muitas coisas, sobretudo a dar valor ao que nos une aos outros, amando, perdoando, valorizando o que há de melhor em nós. O limite é o Céu. Tudo é possível para aquele que crê.

       Jesus põe Simão (e os demais) à prova e incita-o/s a ir mais longe: «Faz-te ao largo e lançai as redes para a pesca». Pedro começa por sublinhar as suas dúvidas, mas por pouco tempo: «Mestre, andámos na faina toda a noite e não apanhámos nada. Mas, já que o dizes, lançarei as redes».

       São compensados pela ousadia, pela confiança em Jesus: “Eles assim fizeram e apanharam tão grande quantidade de peixes que as redes começavam a romper-se…”

 

       2 – Isaías, Simão Pedro, Paulo de Tarso. Três seres humanos que se deixaram tocar pelo Céu e ousaram ultrapassar os seus limites, os seus preconceitos e os condicionalismos/circunstâncias do seu tempo. Não se deixaram dominar nem pelo medo, nem pelo pessimismo, nem pela comodidade de outros.

       Diante do chamamento de Deus, Isaías sente-se pequenino:

       Então exclamei: «Ai de mim, que estou perdido, porque sou um homem de lábios impuros, moro no meio de um povo de lábios impuros e os meus olhos viram o Rei, Senhor do Universo». Um dos serafins voou ao meu encontro, tendo na mão um carvão ardente que tirara do altar com uma tenaz. Tocou-me com ele na boca e disse-me: «Isto tocou os teus lábios: desapareceu o teu pecado, foi perdoada a tua culpa». Ouvi então a voz do Senhor, que dizia: «Quem enviarei? Quem irá por nós?» Eu respondi: «Eis-me aqui: podeis enviar-me».

       Poderia fixar-se nos seus medos e absolutizar as suas limitações, embarcando num redemoinho de ansiedade, de nervosismo, de fuga, de rejeição. Mas ousou criticar os seus demónios. Torna-se um dos Profetas mais interventivos e marcantes.

 

       3 – Simão Pedro é um diamante em bruto que é preciso lapidar, para o fazer brilhar no campo das emoções e dos sentimentos. Há de tornar-se um líder convicto. Por ora é uma pessoa impulsiva, titubeante, um tanto ou quanto rude.

       Diante da proposta de Jesus, Simão Pedro reflete de imediato o que lhe vai na alma. A dúvida e o medo de falhar, mas logo a confiança no Mestre da Vida.

“Simão Pedro lançou-se aos pés de Jesus e disse-Lhe: «Senhor, afasta-Te de mim, que sou um homem pecador». Jesus disse a Simão: «Não temas. Daqui em diante serás pescador de homens». Tendo conduzido os barcos para terra, eles deixaram tudo e seguiram Jesus”.

       E com Pedro, os outros apóstolos. Mas a história não acaba aqui. Haverá muitas ocasiões em que dúvida voltará, e o medo, e a ansiedade, e a hesitação. Ainda havemos de assistir à negação de Pedro.

 

       4 – Paulo é assaltado pelo preconceito, seguindo a opinião que se espalhou à sua volta. Mas bem no seu interior vai-se operando uma grande transformação. Ele critica o caminho que vai percorrendo. Predispõe-se a ouvir, a ver, a descobrir a beleza que possa existir naqueles que persegue.

       Ele próprio fala da sua conversão e persistência:

“Transmiti-vos em primeiro lugar o que eu mesmo recebi: Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras; foi sepultado e ressuscitou ao terceiro dia, segundo as Escrituras, e apareceu a Pedro e depois aos Doze... Em último lugar, apareceu-me também a mim... tenho trabalhado mais que todos eles, não eu, mas a graça de Deus, que está comigo. Por conseguinte, tanto eu como eles, é assim que pregamos; e foi assim que vós acreditastes”.

       Paulo foi atingido pelo carisma de Jesus Cristo, pela grandeza dos Seus sonhos, pela humanidade do Seu projeto de vida.


Textos para a Eucaristia (ano C): Is 6,1-2a.3-8; Sl 137 (138); 1 Cor 15,1-11; Lc 5,1-11.

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