51. Aprenda a dizer não (com razões razoáveis) para valorar o sim.
Aprenda a dizer não (com razões razoáveis) para valorar o sim.
Há muitas situações em que temos de dizer não.
Não por birra, ou por maldade, ou por orgulho, ou por que nos apetece chatear os outros, ou porque dessa maneira mantemos a nossa posição, ou porque não nos queremos comprometer.
Há muitas situações que seria mais fácil dizer sim, mas para sermos honestos e justos temos que responder (claramente) não. Falo também por experiência própria nas comunidades paroquiais como na escola (enquanto professor de EMRC).
O que nos pedem, e a forma como o fazem, graúdos e miúdos, enternece-nos, mas nem sempre é o caminho da verdade. Porque também nem sempre o caminho mais fácil é o que nos leva mais longe e ao destino certo.
Na liturgia da Palavra deste Domingo, escutávamos, na segunda epístola de São Paulo aos Coríntios, que Deus responde sempre SIM às Suas promessas, a favor de toda a humanidade. O Apóstolo e os seus companheiros procuram também que a sua linguagem, para a comunidade, seja sempre sim, e não alternadamente, umas vezes sim e outras não. Sempre sim.
No Evangelho, e como refletíamos ontem, Jesus convida à transparência na linguagem: "sim, sim" e "não, não".
São duas formas que apostam na transparência e na benevolência. Não há que enrolar os outros com meias verdades, e no caminho da prática cristã o sim é ponto de partida, de chegada, é alimento, é sustento da fé.
No caso presente - e mais uma vez não pretendemos ser nem taxativos nem definitivos, estamos a caminho, a partilhar e a aprofundar alguns pensamentos (positivos) - trata-se de não termos medo daquilo que o nosso não possa provocar. Obviamente, não dizemos não para irritar o outro, ou para lhe fazer mal, mas dizemos "NÃO" quando a verdade e a caridade o impõem. Sublinhamos: verdade e caridade. Havemos de cá voltar. A sinceridade por vezes é desculpa para ofendermos os outros e a sua dignidade. Tenho de ser sincero... e digo o que me dá na real ganha sem olhar à pessoa que tenho diante de mim (não confundir com outra situação: sou brando e agressivo, conforme a simpatia que a pessoa gera em mim - este seria um caso típico de acepção de pessoas).
Queremos ser agradáveis e dizemos sim. É mais fácil... a não ser que nos estejam a pedir algo, ou a pedir o nosso tempo e trabalho, aí o sim pode já não ser do nosso agrado. Mas sempre é mais simples, mais gratificante, mais cómodo, dizer sim. Como pais, como educadores, quantas vezes a tentação de dizer sim é maior?! Na volta temos sorrisos, palavras agradáveis, boa disposição. É da nossa natureza, dizendo sim conseguimos um fácil aplauso e/ou louvor.
Aliás, é bom dizer sim e sentirmo-nos bem porque fomos e pudemos ter sido prestáveis. Mas que o sim não tenha como fim o aplauso fácil. Que seja um sim convicto, consciente, e que dignifica a nossa postura, procurando a tal coerência de vida, dizemos "sim" porque está de acordo com as nossas convicções.
Se dizemos "não", temos amuos, contestação, indisposição, irritação.
Quantos filhos não quereriam ter pais que lhes dissessem "não", quantos filhos não gostariam que os pais um dia lhes tivessem dito não! Na adolescência e na juventude, os pedidos dos filhos por vezes são forma de testarem os pais, são momentos de afirmação e são ocasiões para o pais/educadores dizerem "não" (quando se justifica) e explicar porquê. Dar razões. Confiar neles. Do mesmo jeito, quando for possível dizer sim. Confiar. Estar atento. Ser claro. Ouvir as razões do filho/aluno. Não ter medo de fazer concessões, até como forma de responsabilizar. Não há vitórias ou derrotas no relacionamento humano. Há ganhos, crescimento, partilha, enriquecimento mútuo. Nunca ganhamos à custa do sofrimento do outro. Nunca sairemos vencedores de um conflito emocional/afetivo. Sairemos todos a perder. Vale a pena apostar no diálogo, na compreensão. Nem sempre é fácil. Ou quase nunca é fácil. E neste campo, depende muito de pessoa para pessoa e também das pessoas que estão frente a frente.
Se um filho ou um aluno não tiver limites, não saberá distinguir o certo do errado, o justo do injusto, o verdadeiro da mentira, a liberdade da libertinagem.
Uma das histórias da minha infância é sintomática. Aprendi com os meus pais, mas também na escola (ou vice versa): um homem foi condenado à morte por roubar. Já várias vezes tinha sido denunciado. E foi condenado à morte na forca. como último desejo pediu para beijar a mãe, quando estava com a corda no pescoço. A mãe aproximou-se e o filho (mesmo ladrão continua a ser filho querido) arrancou-lhe o nariz com os dentes. E deu a sua explicação: quando eu era pequenino e cheguei a casa com uma agulha (roubada), se a mãe não a tivesse aceitado, mas perguntado onde a tinha encontrado e me tivesse obrigado a devolvê-la e me desse duas bofetadas (hoje já não se usam bofetadas, passou de moda), talvez eu nunca me tivesse tornado ladrão e hoje não estaria aqui.
Trata-se mais uma vez do justo equilíbrio e que na prática, no concreto do dia a dia, não é fácil, sobretudo para os pais a tempo inteiro (isto é para os pais que realmente se preocupam e acompanham o crescimento dos filhos).
Há que não ter medo de dizer "NÃO". Os filhos precisam de ouvir o "não" firme dos pais, reconhecendo a sua preocupação e o seu amor. Ninguém diz "não" para chatear os filhos. Penso eu. Ou para chatear os alunos. Penso eu que não. Ou para chatear as pessoas a quem se diz não...
Quando se equilibra o não com o sim, procurando o melhor para aqueles que estão ao nosso encargo, então quer o não quer o sim serão compensadores, se levarem a uma vida mais saudável e se resultarem do melhor que há em cada um...
Do dizer ao fazer vai um longo caminho... mas podemos começar... o caminho faz-se caminhando, às vezes tropeçando, ou caindo... importa não desanimar. Deus caminha connosco e nos outros podemos encontrar-nos com Ele.