28. A coerência de vida há ser um modo de viver
A coerência de vida há ser um modo de viver.
Para alguns é fácil cumprirem com a palavra dada.
Antigamente bastava a palavra, a chamada palavra de honra. Quando alguém dava a sua palavra, não era preciso nenhum documento, e também era desnecessário recorrer à justiça para dirimir o que foi assumido verbalmente. Obviamente que estamos a falar de pessoas de bem, que preferiam sair prejudicadas, ou deixar de comer, do que deixar de cumprir com a palavra.
Hoje, infelizmente, o valor da palavra é menor. A crer no que vemos e ouvimos. Saliente-se que muitos não cumprem, porque as situações se alteraram dramaticamente. Mas também há muitos que aproveitam as situações desfavoráveis dos outros para se governarem. A palavra de honra levava consigo a dignidade da pessoa. Não cumprir seria uma vergonha, o que equivaleria hoje a dizer que alguns, pessoas e empresas, perderam a vergonha. Sublinhe-se, uma vez mais, que a generalização é perigosa e pode mesmo ser perversa, pois pode haver pessoas incumpridoras que tudo fizeram e tudo fazem para saldar os compromissos assumidos.
O Papa Paulo VI numa intervenção pública afirmou com clareza que existia um grande divórcio entre a fé e a cultura, o evangelho e a vida, a igreja e a sociedade, manifestando a necessidade da prática cristã iluminar a vida quotidiana. João Paulo II e Bento XVI têm acentuado a necessidade de a fé se tornar significativa para as pessoas e para o mundo, através do testemunho. O nosso tempo precisa sobretudo de testemunhas (mártires), mais do que mestres, ou então, mestres que sejam também testemunhas.
A coerência é exigida a todos. O ser humano, na sua identidade mais profunda, há de ser para o mundo, para os outros, o que é para si mesmo. Se quisermos, adequa-se também aqui a regra de ouro: faz aos outros o que queres que te façam a ti, ou não faças aos outros o que não queres que te façam a ti. O corpo que delimita a fronteira da nossa existência coloca-nos em comunhão e contacto com os outros e com o mundo. O ideal é que o corpo não se separe da nossa mente, dos nossos propósitos, das nossas convicções, mas que aquilo que nos aproxima dos outros (corporeidade) esteja revestido do que de melhor existe em nós.
Por maioria de razão, para o cristão, a coerência é um desafio e um compromisso, pelo facto de ter (ou dever ter) uma consciência mais apurada e esclarecida, porque o horizonte da sua vida não se confina ao tempo e à história, mas abre-se até à eternidade de Deus e porque deverá imitar quem lhe dá o nome: Cristo (cristãos = de Cristo). A identidade cristã remete-se para a postura de Jesus Cristo.
É o próprio Cristo que o lembra quando une os dois mandamentos: Amar a Deus e ao próximo como a si mesmo. Escutaremos depois o apóstolo são João a dizer que é mentiroso quem diz amar a Deus que não vê e não ama ao irmão que vê, ou o apóstolo são Tiago que recorda que é pela obras se vê a fé.
No evangelho deste domingo (IV Domingo do tempo Comum - ano B), diz-se que Jesus ensinava com autoridade e não como escribas, ou seja, Jesus não fala para os outros, não exige mais do que para si mesmo, da forma como vive assim o ensina.
A velha e popular expressar: "bem prega frei Tomás, faz o que ele diz e não o que ele faz", não serve de escusa nem de justificação para bonitas palavras ou discursos bem elaborados mas que depois não têm aplicação na vida. As nossas palavras hão de ilustrar-se com a nossa vida.
Com as nossas limitações e fragilidades, por vezes - não nos falte pelo menos essa consciência - distanciamo-nos nos gestos e nas obras daquilo que professamos/afirmamos com os lábios e outras vezes exigimos aos outros o que nem nós temos intenção de viver. Mas não nos iludamos, devemos buscar o ideal, e procurar que o possível do nosso quotidiano nos vá treinando para a perfeição, para o ideal, para a coerência.
Continuamos no nosso caminho de santidade.