1 – A liturgia batismal, na bênção da água, apresenta referências bíblicas nas quais a água está em clara evidência. No relato da criação, melhor, nos dois relatos da criação: Deus faz separar as águas da terra para que haja vida; Deus faz chover para que a vida germine da terra. O episódio sobejamente conhecido do Dilúvio, com Noé e a construção da Barca, sendo a água um elemento destruidor – a humanidade do pecado é submersa – e a mesma água suporta e salva a Arca com Noé e a sua família. A travessia do mar vermelho marca a condenação dos soldados egípcios que a água aniquila, que simbolicamente representam o mal agora levado pela água. A mesma travessia protege o povo eleito, que passa pela água para terra firme, com Moisés. Os filhos de Israel são salvos pela água. Um dos significados possíveis do nome MOISÉS é precisamente “salvo das águas”.
O episódio que hoje celebrámos – o batismo de Jesus no rio Jordão – é também evocado na bênção da água. João batiza o autor do batismo. É um batismo de penitência, de preparação, pois logo virá Aquele que batizará no fogo e no Espírito Santo.
A própria palavra – baptizar –, de origem latina, significa mergulhar. O neófito entrava por três vezes na água, em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, para que água levasse o homem velho, e dela surgisse o homem novo, nova criatura para Deus.
2 – Quando lhe perguntam por que batiza se não é o Messias, João sublinha que o seu batismo é sobretudo chamada de atenção, apelo à conversão, à penitência, à mudança de vida. Só um coração atento, humilde, desperto para os outros, poderá reconhecer e acolher Aquele que vem de Deus, o mistério, o divino. Prepara a terra para que a semente lançada encontre o ambiente propício…
Pressente-se um tempo novo que ora chega com Jesus:
«Eu batizo-vos com água, mas vai chegar quem é mais forte do que eu, do qual não sou digno de desatar as correias das sandálias. Ele batizar-vos-á com o Espírito Santo e com o fogo». Quando todo o povo recebeu o batismo, Jesus também foi batizado; e, enquanto orava, o céu abriu-se e o Espírito Santo desceu sobre Ele em forma corporal, como uma pomba. E do céu fez-se ouvir uma voz: «Tu és o meu Filho muito amado: em Ti pus toda a minha complacência».
Com o batismo de Jesus cumpre-se, simbolicamente, toda a justiça. Sendo filho de Deus, não precisava de ser batizado. No batismo, Jesus garante que em tudo cumpre com a ENCARNAÇÃO, seguindo também os usos e tradições do povo que O vê nascer. Está entranhado na história e no tempo, e não por cima ou à margem.
3 – A vida pública de Jesus arranca a partir do batismo. Como cristãos a nossa vida inicia-se com o batismo, Sacramento de pertença a Jesus Cristo, identificação com a Sua morte e ressurreição, inserção no Corpo de Cristo que é a Igreja. Morremos para o pecado, ressurgimos para a vida nova. Somos, pelo Espírito Santo, novas criaturas.
O batismo celebra-se todos os dias da nossa vida. O batismo não é um dia de festa, é toda a vida. Dizer SIM com os lábios, de uma vez para sempre, e depois agir como NÃO ao longo da vida quase sempre dá mau resultado.
Exemplos: quando os noivos dizem SIM de uma vez para sempre e se sentam à sombra da bananeira, como se tudo estivesse garantido a partir desse primeiro momento, vão sair magoados, infelizes e lesados… O SIM não é passivo nem passado, é proactivo, presente, significa cuidar, ouvir, amar, sofrer com o outro, usar de palavras atenciosas, e ter gestos de gratidão e de alegria pela presença do outro, renovando o desejo e o sentimento.
Os pais para com os filhos. Não basta fazê-los, é preciso cuidar, educar, acompanhar, repreender, elogiar, apontar limites e possibilidades, marcar fronteiras, para que o filho saiba que os pais estão atentos ao que faz, ou deixa de fazer, por que o amam e lhe querem bem, mesmo que tenham os seus defeitos e pecados e por vezes sejam injustos... mas estão presentes, renovando o SIM primeiro todos os dias.
O SIM que Deus nos dá há de levar-nos a um SIM permanente. Todos os dias somos batizados, renovados, todos os dias ressuscitamos com Jesus Cristo.
Textos para a Eucaristia (ano C): Is 42, 1-4.6-7; Atos 10, 34-38; Lc 3, 15-16.21-22.