Sê profeta na tua vida, na família, no trabalho, na comunidade.
Ninguém é profeta na sua terra.
Proximidade e distância.
Namoro e compromisso.
A horta da vizinha é melhor que a minha.
Psiquiatras. Psicólogos. Sacramento da Confissão.
Torna-se ator da tua vida e não apenas espectador da tua história.
Jesus Cristo. Augusto Cury. Cada um de nós. Principezinho.
Santos para os outros, mas em casa autênticos demónios.
Alguém um dia, referindo-se à Princesa Diana, disse que era fácil amá-la. Todo o mundo a amava. Salvo seja. Prefiro, pessoalmente, princesas reais, de carne e osso e não de plástico, feitas por medida, pelas televisões e revistas coloridas. Também nada me move contra quem faz a sua vida nas passarelas da visibilidade, sabendo-se sempre que as suas vidas em privado são como a do comum dos mortais, com choros e risos, com boa disposição e com inseguranças várias, com medo e confiança, com dúvidas e com sonhos, com fracassos e recomeços. Não muito diferente da vida de qualquer um, sabendo-se que cada um, mesmo em circunstâncias semelhantes, vive de maneira diferente, à sua maneira.
Há almas que sangram, ainda que aparentemente o rosto sorria.
Talvez tenha sido assim com aquela princesa, talvez seja assim com muitas princesas que encontramos no nosso dia-a-dia.
Lembra-me uma pequena história.
Um dia um homem foi ao psiquiatra, muito deprimido, desencantado com a vida, com as pessoas. O psiquiatra, depois de o ouvir, em algumas sessões, deu-lhe um conselho que julgou ser importante: por que é que não vai assistir à exibição de um palhaço, na praça central, todos os dias, ao fim da tarde? Vai ver que se sente melhor. Ele encanta. Faz-nos rir desbragadamente. Vai ver que não se arrepende. Da próxima vez que cá voltar, virá um homem diferente.
- Esse palhaço, respondeu o paciente, sou eu!
Como diz o povo, cada um sabe o que vai em sua casa.
Ninguém é profeta na sua terra.
A expressão é de Jesus Cristo, quando vai à sua terra e não é bem recebido.
Isto diz muito das nossas vidas. Em casa, somos nós. Em casa, muitas vezes, deixamos vir ao de cima o melhor e o pior. Fora deixamos ver apenas o melhor. Em casa, conhecem as nossas fragilidades. Fora, conhecem o que mostramos. É assim, positiva e negativamente. Os que nos são mais próximos conhecem-nos melhor, conhecem o lado solar e o lado lunar. Em casa distendemo-nos. Fora, contraímo-nos. Com efeito, recolhemos sempre a casa, é onde nos sentimos melhor. Por vezes, poderá ser um problema: porque estamos em casa não temos o mesmo cuidado e atenção que deveríamos ter com os que nos são mais próximos. Ou porque já sabem dos nossos sentimentos. Ou porque "têm" obrigação de conhecer as razões para estarmos com os azeites.
Funciona também quando precisamos ou prestamos ajuda.
Os santos da casa não fazem milagres.
Ouvimos o mesmo a uma pessoa que nos é próxima e a uma pessoa que (ainda) não nos é nada, e nos conselhos que nos dão, uma e outra, nas palavras e nos gestos, podem ser exatamente iguais, só ouvimos o que não nos é familiar.
Daí a importância dos psicólogos, dos psiquiatras, do sacramento da Confissão (tem inevitavelmente uma dimensão terapêutica).
Se é uma pessoa que não nos deve nada, então o que nos diz é para levar a sério.
Se é uma pessoa próxima, cumpre a sua obrigação e diz por dizer, são palavras (de simpatia, ou não). Nada mais. Pode até sugerir um caminho. É sempre suspeito. Por vezes precisamos de consultar o médico para ele nos dizer que o que temos é o que já sabíamos que tínhamos e que os nossos familiares nos tinham dito que tínhamos. Mas o médico é médico. E ai se ele diz que não temos nada... é porque não presta!
Por outro lado, se preciso de ajuda (e quero ser ajudado) recorro a alguém que possa distanciar-se dos meus problemas para ver melhor, para que as suas respostas e ajudas não sejam suspeitas. Mesmo que por vezes saibamos que também somos médicos de nós mesmos, precisamos de outros olhos, de outra visão, da opinião de alguém que não seja suspeito por estar demasiado envolvido.
Como referimos antes, é preciso ver toda a floresta. Entrar na floresta. Ver que a árvore que nos tapa a visão é só uma árvore. Há outras árvores. É preciso entrar para conhecermos. É preciso distanciar para compreender...
O namoro inseria-se nesta perspetiva: levava a que as pessoas tivessem um tempo para se conhecerem, para que o olhar primeiro da paixão, que deixa ver apenas qualidades, não ofuscasse uma visão mais completa e verdadeira da pessoa de quem nos aproximamos. A intimidade surgia apenas depois de um tempo (mais ou menos longo) de conhecimento, de descoberta, de proximidade... O compromisso aparecia quando já se conheciam também algumas imperfeições. Atente-se para o facto de alguns procurarem esconder os defeitos, as inseguranças, enquanto não assegurassem um compromisso. Com o tempo, com a proximidade, deixamos de ter cuidado, pouco a pouco deixamos ver também as insuficiências. E, por outro lado, passamos a descobrir também no outro as suas fragilidades.
Agora avança-se de imediato para o compromisso, e quando as pessoas se conhecem, vem o descompromisso. Por vezes mais rápido que o expectável.
Uma dimensão muito curiosa do ser humano.
Enquanto em atitude de conquista, é atencioso, diplomata, coloca o melhor de si mesmo.
Depois da conquista, relaxa. Em excesso, por vezes. Por um lado, as pessoas não podem e não devem estar em constante "conquista", precisam de se sentir seguras, em casa, relaxadas. Por outro outro lado, a atenção e delicadeza devem nortear todo e qualquer comportamento.
Neste sentido, hoje propúnhamos: seja profeta na sua vida, na sua casa, na sua comunidade. Faça-se presente. Sinta-se filho (e não enteado). Sinta o pulsar da vida como desafio, Procure ser simpático, envolvente, atencioso. Coloque o melhor de si mesmo no encontro com os que lhe são mais próximos. Que a sua proximidade o distancie da frieza, da indiferença, da indisposição. Seja ator. Não espectador. Tome a iniciativa. Tem medo. Não hesite. O não está certo. Por que não habilitar-se ao sim. Acolha. Viva. Celebre.
É fácil que todo o mundo aclame a Princesa Diana, menos o seu marido e os de sua casa. À distância é fácil amar, louvar, admirar. Perto, vemos os defeitos, torna-se mais difícil. O essencial, a amizade, ou o amor autêntico, é aquele que reconhece as perfeições e imperfeições do outro e ainda assim lhe quer bem.
Tomemos por exemplo Jesus Cristo. Chama os seus discípulos. Conhece-os. Sabe que são impulsivos, que não têm formação, que não são benquistos pela população, hesitantes, e até de honestidade duvidosa. Ainda assim, Jesus chama-os, quere-os junto de Si, quer fazer deles "pescadores de homens", quer explorar o melhor que eles têm. Aposta neles, mesmo que vislumbre a dúvida, a negação, a traição. Acredita que o amor, a confiança, o perdão, são mais fortes.
Sejamos profetas em nossa casa. Não depende dos outros. É uma atitude nossa. Pode ser correspondida ou não. Sejamos atores. Não esperemos que os outros sejam atenciosos, meigos, simpáticos, para o sermos também. Alguém tem de tomar a iniciativa. Mesmo que com o tempo se torne doloroso ser rejeitado ou incompreendido.
Insista. Como Jesus. Ele nunca desiste das pessoas. Nem de Judas, o discípulo que mais amou e mais protegeu. Conhecia a sua fragilidade, o seu íntimo, dedicou-lhe tempo, atenção, atribuiu-lhe responsabilidades, manteve-o por perto. Até ao fim. Judas não compreendeu o amor de Jesus, não correspondeu. Jesus não desistiu.
Não desista, pelo menos no início, pelo menos sem tentar.
É tão fácil ser deus para os que nos são estranhos.
É tão fácil estar de passagem na vida de alguém, ou até mesmo na vida de uma comunidade. Tudo é fácil, tudo é agradável, promissor. Difícil é permanecer, permanecer em todos os momentos, não apenas quando tudo corre bem. Há pessoas extraordinárias, para toda a gente, boas, generosas, agradáveis. Porém, para os de casa são um sobressalto, uns demónios, sempre carregados de indisposição. Que valor há nisso? Todos conseguem. Seja diferente. Comece no seu coração, em sua casa, na sua família. Dê o melhor de si mesmo. Seja coerente de dentro para fora (e se necessário, do exterior para o interior), primeiro seja profeta em casa. Depois leve a profecia até às alturas.
A felicidade encontra-se em casa.
No seu coração. A busca interior é a mais importante. Pode ser a mais compensadora. Será sempre mais duradoura. O Principezinho vai por muitos mundos, mas regressa a casa, ao seu mundo, à sua flor. É o tempo que gastamos com a nossa flor que a tornamos bela para nós. Gaste tempo com a sua flor, com a sua casa, com a sua família. Estará ainda mais disponível para os que estão fora da sua casa. Pode até tornar-se casa também para os outros. Não inverta. Comece em si, em sua casa.